19 agosto, 2009

Revalidação de Diploma: Direito do Cidadão e Dever do Estado

Os brasileiros ou estrangeiros graduados em Medicina no exterior estão sendo vítimas de abuso de poder/direito das autoridades administrativas de várias universidades públicas, especialmente, dos membros das Comissões de Graduação das Faculdades de Medicina.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação está sendo mal aplicada nas universidades públicas nos processos de revalidação de diplomas de médicos graduados no exterior.
Em 2002 o Conselho Nacional de Educação emitiu a Resolução n° 01/2002, na tentativa de coibir os abusos praticados contra os profissionais com diploma estrangeiro.
O cidadão com diploma estrangeiro na área médica é quase um cidadão sem direito algum em nosso país.
Não fora o Poder Judiciário e o Ministério Público Federal, esses profissionais estariam condenados a permanecer sem direito ao trabalho na área de sua formação, porque o Conselho Federal de Medicina não quer aumentar o número de profissionais em seus quadros sob o vazio argumento de que existe número suficiente de médicos para a demanda da população.
O procedimento das autoridades dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina fere o Código de Ética Médica e causa prejuízos aos médicos e à sociedade brasileira carente de atendimento médico , especialmente, nas regiões mais carentes.
A situação está se tornando cada vez mais grave, portanto impõe-se que esses conflitos sejam solucionados pelo Poder Judiciário, com base no espírito da LDB e nos fundamentos e princípios constitucionais que asseguram a todos o Direito ao Trabalho e o respeito aos princípios fundamentais da Constituição Federal que regem as relações internacionais.
A questão há de ser examinada à luz de fundamentos e princípios constitucionais ínsitos nos artigos 1°, 3°, 4°, 5°, 6° e 37, da CF.
Assim, com base nos fundamentos e princípios da Lei Maior, é inaceitável que um profissional com diploma estrangeiro possa ser tratado como marginal pelos agentes públicos das universidades e dos conselhos de medicina – o tratamento desumano dispensado aos médicos com diploma estrangeiro caracteriza grave afronta aos princípios que devem nortear os atos dos servidores públicos (Lei n° 8.112/90) e afronta ao Código de Ética Médica.
Há que considerar que os tratados, normas resoluções pareceres da OIT, ONU, das Cortes Internacionais, do Mercosul coíbem qualquer tipo de abuso aos cidadãos independentemente de nacionalidade no que diz respeito a Direitos Humanos e Direito ao Trabalho. Existe enorme preocupação das Cortes Internacionais com relação ao Direito ao Trabalho dos cidadãos migrantes, fronteiriços, aos Médicos sem Fronteiras.
A universidade não pode emitir normas internas contrárias à legislação federal que regula a matéria, para atender às “diretrizes” emanadas do Conselho Federal de Medicina, órgão de fiscalização do exercício profissional, que não detém competência para “legislar” em matéria de educação.
Prova de que a universidades públicas estão submetendo-se a normas ilegais emanadas do Conselho Federal de Medicina é o Ofício n° 100/03 – COMGRAD/MED, no qual a Vice-coordenadora da Comissão de Graduação da Faculdade de Medicina da UFRGS admite que os pareceres dessa comissão estão sendo proferidos com base nas DIRETRIZES PARA REVALIDAÇÃO DE DIPLOMA DE MÉDICO OBTIDO NO EXTERIOR, do Conselho Federal de Medicina, de 08 de janeiro de 2003.
Para coibir esses abusos o eminente Procurador Federal CLÁUDIO DUTRA FONTELLA, do Ministério Público Federal de Santa Catarina, emitiu a Recomendação n° 007/2003, no sentido de que a Reitoria da UFSC respeite o princípio da legalidade, sob pena de seus agentes serem responsabilizados civil, penal e administrativamente, onde se lê:

“(...)
Recomenda-se ao Reitor da UFSC e ao Presidente do Colegiado do Curso de Graduação em Medicina, bem como aos seus subordinados, que cumpram integralmente o teor da Resolução nº 01/2002 do CNE/CES no julgamento dos pedidos de revalidação de diplomas estrangeiros, sob pena de responsabilização dos envolvidos nas esferas cível (Art. 11 da lei 8.429/92), administrativa (Art. 116, III da Lei 8.112/90) e criminal (Art. 319 do Código Penal).”
A legislação federal em vigor – Lei n° 9.394/96 – é clara no sentido de prever o respeito a acordos internacionais.
A Lei de Diretrizes e Bases de Ensino (Lei nº 9.394/96) em seu artigo 48, parágrafo 2º, assim estabelece:
“Art. 48 - Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão validade nacional como prova da formação recebida por seu titular.
Parágrafo 2º - Os diplomas de graduação expedidos por universidades estrangeiras serão revalidados por universidades públicas que tenham curso do mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de reciprocidade ou equiparação.”
A revalidação é dispensável nos casos previstos em acordo cultural entre o Brasil e o país de origem do diploma, subsistindo, porém, a obrigatoriedade de registro, quando este for exigido pela legislação brasileira.
O voto do eminente Desembargador Federal Luiz Carlos Lugon de Castro, por ocasião do julgamento da Apelação Cível n° 2005.72.00.002221-8,resume com rara sensibilidade o direito de revalidação dos diplomas dos médicos:
“Com toda a vênia, ouso divergir da solução emprestada por V.Exa.
Não consigo vislumbrar, na hipótese, em face da existência de um acordo internacional, possibilidade de discernimento fundado exclusivamente na nacionalidade. O fato de ter nascido em Cuba, o fato de ter nascido no Brasil, o fato de já estar em Cuba, o fato de ter ido para lá não representa discrime dentro de uma ótica de todos-são-iguais-perante-a-lei. Não há nem pressuposto fático que autorize essa discriminação. Por outro lado, ainda que revogando posteriormente o Decreto 80.419, o fato é que esse decreto estava em vigência, havia direito adquirido, consolidado, pelo menos aquilo que se pode dizer de direito expectativo e não mero expectativa de direito. Então, em face disso, é impositivo constitucional primeiramente que se dê tratamento isonômico; em segundo lugar que a Nação cumpra a sua obrigação que assumiu em pleno exercício da soberania e respeite esse direito adquirido.
Então, com base nesses argumentos e mais aqueles que já foram explicitados tanto na tribuna quanto na cuidada sentença eu estou negando provimento ao apelo.”
:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.72.00.002221−8/SC
RELATOR : Des. Federal EDGARD ANTÔNIO LIPPMANN JÚNIORAPELANTE : UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA − UFSC
ADVOGADO : Antonio Marcos Guerreiro Salmeirão
APELADO : MARIA DEL CARMEN SALCEDO CABRERA
ADVOGADO : Marise Gomes Siqueira e outros
EMENTA
ADMINISTRATIVO. REGISTRO DE DIPLOMA DE CURSO SUPERIOR OBTIDO
NO EXTERIOR.
1. Muito embora tenha sido revogado o Decreto nº 80.419/77 pelo de nº 3.007/99, a autora−apelada está amparada pelo direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da Constituição Brasileira de 1988), tendo direito ao registro automático de diploma de curso superior no exterior.
2. Apelação improvida.
Resta claro que os óbices estão sendo criados pelo Conselho Federal de Medicina e Conselhos Regionais de Medicina – a quem não cabe intervir em questões educacionais, mas tão-somente fiscalizar o exercício da profissão. Resta claro, também, que as Universidades Federais na verdade estão violando a LDB e, desta forma, ao invés de atender aos interesses dos profissionais com diploma estrangeiro e do próprio MEC, que estipulou o sistema para revalidação de diplomas, está agindo para atender interesses corporativos dos médicos.
A “Declaração de Bruxelas II”, sobre direitos humanos e liberdade individual dos médicos, adotada pela 37º Assembléia Geral da Associação Médica Mundial em Bruxelas, outubro de 1985, precisa ser respeitada pelos médicos brasileiros e sua entidade de classe - a revalidação de diplomas estrangeiros é direito do cidadão e dever do estado.

3 comentários:

Direito Popular disse...

Olá colega gostei de sua materia sobre a revalidação, muito boa estou desenvolvendo meu TCC no tema, consegui identificar seus raciocinios olha se vc tiver amis materias eu agradeço

um abraço.
Claudinei dos santos Freitas.

Claudineideponta@bol.com.br

Edna disse...

Parabéns pela excelente matéria sobre revalidação. Moro no Estado do TO, onde há vários municípios sem médicos e sei da dificuldade em revalidar o diploma, mesmo para aqueles que formaram na vigência do Decreto que determinava a revalidação automática do mesmo.
Abraço.

Anônimo disse...

Olá Colega,
Eu moro no MS, a região aqui é fronteira com o Paraguai tem várias Faculdades onde tem sido o refugio de muitos brasileiros que querem fazer medicina e por algum motivo não tem conseguido realizar seus sonhos no Brasil, mas agora com a portaria interministerial onde coloca o INEP para formalizar um projeto piloto onde sera feito em duas fases, esta se evoluindo espero que a população seje atendendia por médicos independentes de nacionalidade de seus diplomas ..
um abraço
Claudinei dos Santos Freitas