14 julho, 2010

Divórcio rápido

No Brasil cerca de 500 mil pessoas se separam anualmente, portanto, o divórcio direto atende os anseios da sociedade.

Wanda Siqueira - advogada

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EDITORIAL - [ 14/07 ]
Divórcio rápido


Notícia publicada na edição de 14/07/2010 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 3 do caderno A - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h

É preciso reconhecer que a nova regra se amolda melhor ao regime de liberdades civis desfrutadas pelo povo brasileiro - e à realidade que se constata facilmente no dia a dia, em juizados e cartórios, onde as separações formais são concretizadas
Sensível à realidade dos casais que optam pela separação, e que precisam formalizar legalmente a dissolução do casamento para resolver pendências e seguir em frente, o Congresso acaba de produzir uma atualização necessária no texto constitucional que trata do divórcio.
Até agora, a Constituição estabelecia a necessidade de separação judicial por mais de um ano ou separação de fato por mais de dois anos, para que o casal pudesse se divorciar. A emenda constitucional nº 66, promulgada ontem após quase três anos de tramitação na Câmara e no Senado, revogou o parágrafo 6º do artigo 226 da Constituição, que estabelecia aquelas exigências, tornando possível o divórcio direto sem prévias condições. Pelo menos sob o ponto de vista legal, a partir da publicação da emenda (que deve ocorrer hoje), nunca foi tão fácil virar a página de um casamento que não deu certo.
A alteração desagradou grupos religiosos, para os quais as facilidades legais podem estimular as separações. Essa é uma discussão antiga e sobre a qual jamais haverá consenso, já que algumas religiões condenam veementemente a dissolução do casamento, em quaisquer circunstâncias.
Em termos sociais e políticos, porém, a queda-de-braço está resolvida desde 1977, quando o Congresso aquiesceu aos argumentos do senador Nelson Carneiro, famoso por sua luta pelos direitos da mulher e da família, e aprovou a emenda constitucional nº 9, que riscou da Lei Maior a indissolubilidade do casamento civil. A derrubada da restrição constitucional abriu caminho para a lei nº 6.515 (Lei do Divórcio), proposta por Nelson Carneiro e Accioly Filho, que já previa a necessidade de prévia separação judicial por um ano antes do divórcio, ratificada posteriormente, em 1988, quando da elaboração da nova Constituição.
Todos são livres para concordar ou não com o divórcio, no âmbito de suas vidas particulares, de acordo com suas crenças e convicções. É preciso reconhecer, no entanto, que a nova regra se amolda melhor ao regime de liberdades civis desfrutadas pelo povo brasileiro - e à realidade que se constata facilmente no dia a dia, em juizados e cartórios, onde as separações formais são concretizadas.
Estatísticas recentes apontam que o total de divórcios, mesmo com as condições impostas, vinha aumentando significativamente em relação ao de separações judiciais. Somente em 2008, segundo a Estatística de Registro Civil do IBGE, foram registrados mais de 188 mil processos ou escrituras de divórcio no Brasil. No mesmo período, houve 959.901 uniões civis, o que indica uma taxa de um divórcio a cada cinco casamentos. Paralelamente, o número de separações judiciais vem caindo ano a ano, indicando uma opção clara pelo divórcio direto (sem separação judicial prévia) - e levantando a suspeita de que muitos casais mentiam, com auxílio de testemunhas, sobre estar descasados há mais de dois anos, para poder se divorciar dessa maneira. Em 2008, os divórcios diretos representaram mais de 70% dos divórcios realizados.
Na prática, a nova realidade constitucional representa um respeito maior pela autonomia dos cidadãos, que vinham sendo obrigados a observar uma carência inexplicável antes que pudessem ter sua vontade reconhecida. Estabelecida numa época em que a legalização do divórcio provocava reações ainda mais enérgicas, a exigência de comprovação da separação prévia não deixava de ser, à sua maneira, uma tutela estatal sobre o livre arbítrio dos casais, em questões que só a eles dizem respeito.
O divórcio direto elimina custas judiciais, desafoga um pouco as varas de família (já que torna desnecessária a separação judicial) e aumenta a chance de se ter, na outra extremidade, um crescimento de uniões formais, uma vez que a pessoa separada não precisará esperar por um ou dois anos para se casar novamente. É uma desburocratização bem-vinda para situações que ocorrem inevitavelmente, e que a lei, de toda forma, não tem força para impedir ou mudar.

Fonte:
Jornal Cruzeiro do Sul

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